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Como se não houvesse amanhã

  • Jason Prado - DP
  • Jun 2, 2016
  • 3 min read

Essa geléia que virou a crônica política, depois que seus personagens passaram a frequentar o noticiário policial, está trazendo consequências estranhas ao comportamento dos brasileiros, estejam ou não engajados nas disputas éticas e ideológicas.

Os sintomas mais esquisitos não são apenas o acirramento de ânimos em torno da velha e surrada dicotomia entre o bem e o mal.

A cada dia o povo está mais próximos das vias de fato, como se fosse uma final de Copa do Mundo.

Por duas ou três vezes, nas últimas semanas, fui envolvido em discussões, via internet, com amigos queridos, antigos companheiros de trabalho, por razões - se não frugais - de total desimportância científica, como dizia Manoel de Barros. Como, por exemplo, as perspectivas da leitura dentro de um possível retorno da Cultura para o âmbito da Educação.

Mas isso está produzindo um efeito colateral tão estranho que, de tanta incongruência, está ficando engraçado: vocês já prestaram atenção nos desmentidos às acusações e revelações dos tais grampos e delações premiadas?

No começo, os advogados diziam coisas do tipo “só nos manifestaremos depois que tomarmos ciência das acusações”.

Ai o ritmo foi se intensificando, e veio a fase de “tudo que fizemos foi absolutamente dentro da Lei”.

Mas até esse bordão começou a ficar surrado. Tantos eram os acusados, e tantas as acusações, que eles passaram a construir um enredo à parte. Sem falar no efeito que produzem no noticiário.

Outro dia, os desmentidos ocuparam mais tempo do que a notícia.

Alguns servem para qualquer acusação. Outros, são tão agressivos contra o delator, que chegam a dar a impressão de que, de fato, são fantasias de um mitômano.

O ponto de virada, se não me falha a memória, foi a delação do Delcídio.

Imediatamente execrado, chamado de calhorda vingativo por Ministros de Estado e a própria Presidente da República, sua delação foi chancelada pelo STF, e vai instruindo inquéritos e indiciamentos em Brasília e Curitiba…

Já os desmentidos, vão ficando no vazio, ecoando constrangimento.

Mas, ao invés de ter servido como exemplo desastrado de desgaste público, aquilo fez escola.

Nos últimos dias, a cada denúncia, surgem dez, quinze envolvidos, e cada um dá sua versão desencontrada da invencionice do delator.

Como se não houvesse amanhã.

Hoje, a propósito do acordo fechado pelo Bené, envolvendo o Governador de Minas Gerais e o secretário pessoal de Dilma (Giles Azevedo), os desmentidos são patéticos. Do tipo: “isso vermelho ai não é batom!”

O tempo e a tecnologia não estão ajudando essas pessoas.

Lá atrás, Dilma se disse enganada por Cerveró no caso Pasadena; hoje ele conta a história em detalhes…

Coisas que há dez anos ficavam no esquecimento, hoje circulam na web. Fatos que antes ficavam no disse-me-disse, hoje deixam rastros tão consistentes como fotografias, filmes de segurança, recibos, passagens - tudo registrado na nuvem.

Não demora mais que um dia para surgir uma nova prova, ou corroborar uma denúncia.

Então, fica a pergunta: por que aumentar o constrangimento?

Por que desmentir o incontestável?

Aquela premissa de Goebels, de que uma mentira dita mil vezes se transformaria numa verdade, tinha coerência numa época em que a informação viajava em telegramas e se estampava nos jornais do dia seguinte.

Por que esse povo todo não adere logo à tal da Delação Premiada, e fazemos um grande expurgo na vida pública brasileira?

Por que o STF, o STJ e o STE não criam uma força tarefa para dar celeridade aos seus casos e zerar essa crise moral que se abateu sobre a Nação?

Alguém tem dúvida de que o tempo já não joga mais à favor do esquecimento?


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